02 agosto 2006

Como resolver a crise da transmissão da fé?

Há alguns dias li um texto chamado "A crise da transmissão da fé", do Rev. Ricardo Barbosa de Souza, conferencista e pastor da Igreja Presbiteriana do Planalto, em Brasília, onde ele alerta para a dificuldade que a Igreja tem apresentado na transmissão da fé cristã genuína.
Com a crescente secularização da sociedade cristã, torna-se difícil distinguir o sagrado do profano, o justo do ímpio, pois suas obras e valores assemelharam-se de tal forma que a linha de distinção entre uma e outra tornou-se tênue ao extremo.
Hoje em dia é comum ligar a televisão e ser bombardeado por programas evangélicos onde se apresenta Jesus das mais variadas formas, do exorcista ao mercador de favores.
Muito se fala de Cristo, fala-se de sua obra, de seu amor, mas pouco se tem falado do fruto produzido por uma vida entregue a Ele. Em Jo 15:16 o Senhor nos diz que fomos designados a produzir frutos e estes devem permanecer. Como as gerações futuras poderão viver uma vida digna do Evangelho se a atual o tem relativizado? Basta ligar a televisão e ver. As verdades sagradas têm dado lugar aos conceitos de líderes que outorgam a si títulos e prerrogativas inexistentes na Palavra. O povo perdeu seu referencial. A igreja cristã como um todo se amoldou ao padrão ocidental de vida de tal forma que deixou de exercer seu papel transformador, não faz mais diferença, não salga nem ilumina (Mt 5:13,14).
Em 1 Co 1:10, Paulo nos roga a falarmos a mesma coisa e que não haja divisões entre nós para que possamos ser unidos no mesmo sentido e parecer. Infelizmente esse pedido não tem sido atendido. A multiplicidade de denominações, doutrinas, "estratégias" e opiniões, criaram uma verdadeira Babel cristã. Para uma determinada denominação, vestir-se desta ou daquela forma é pecado, para outra não, falar em línguas ou bater palmas na igreja são temas de discussões e debates que não produzem nenhum tipo de resultado. Pentecostais, neo-pentecostais, históricos, ortodoxos, reivindicam a detenção do título de "verdadeira Igreja".
Não somente os líderes religiosos têm falhado na missão de transmitir a genuína fé cristã às próximas gerações, o princípio bíblico "ensina a criança o caminho em que deve andar" (Pv 22:6) é negligenciado por muitos pais cristãos que transmitem a obrigação da criação e educação dos filhos a professores multidisciplinares. Em seu frenesi pelo crescimento profissional, pela aquisição de bens que proporcionem conforto e tranqüilidade, pela melhoria da qualidade de vida, esses mesmos pais se omitem ao seu mais precioso papel que é o de transmitir aos filhos valores e princípios Bíblicos.
A crise é real, mas não é definitiva, porque a última e decisiva palavra sempre será de Deus.
Há algumas atitudes que a igreja pode tomar com o intuito de acabar coma crise de transmissão da fé, entre elas temos:

1 – Clamar por avivamento

A igreja precisa clamar por avivamento, mas não o avivamento de mosteiro, que produz resultados entre quatro paredes. A necessidade é de um avivamento que produza resultados na vida cotidiana dos agentes do Reino, pois são esses agentes que produzirão as mudanças na sociedade quando tiverem seus valores e princípios baseados exclusivamente nas Escrituras. A igreja precisa caminhar na contramão do sistema. Deve mostrar que é diferente e fazer diferença tendo sempre em mente que, sem Cristo, nada podemos fazer (Jo 15:15).
Eu tenho esperança de que esse avivamento chegará logo, pois como diz o Rev. Jean Douglas Gonçalves, "o avivamento surge em momentos de crise".
O melhor exemplo de verdadeiro avivamento que podemos destacar foi o acontecido na Rua Azuza em Los Angeles, Eua, nos idos de1906. Na ocasião, a Igreja formal estava, como hoje, secularizada e preocupada em engrandecer pessoas, baseada mais nos homens do que no Espírito Santo. O avivamento da Rua Azuza veio como um furacão, quebrando estruturas e transformando a forma do culto. O que a igreja presenciou naqueles dias foi uma transformação que se demonstrava através de ações como: convicção do pecado e arrependimento, quebrantamento de coração, intercessão contínua pelo avivamento, vida de oração, a reunião era um encontro com Deus, não um evento social, o interesse principal era chegar-se a Ele, não havia acepção de pessoas, ricos e cultos eram tratados iguais aos pobres e ignorantes, não havia espaço para orgulho, auto-afirmação ou soberba, tinham consciência da sua pequenez, do nada saber, do nada possuir, a não ser o que o Espírito lhes ensinava e inspirava, não ostentavam as suas boas-obras, para que elas não se tornassem uma armadilha, o conteúdo da pregação era o amor e a pessoa de Cristo, não havia palavra indelicada contra os inimigos ou contra outras igrejas.
Isso é apenas um exemplo do fruto produzido por um verdadeiro avivamento.

2 – Voltar às Escrituras

Outra atitude a ser tomada pela igreja atual deve ser a volta às Escrituras, ser como o povo de Beréia (At 17:11) que buscava na Palavra a veracidade do que era pregado pelos apóstolos.
Como foi dito acima, vivemos uma Babel cristã, onde cada denominação tem seu conceito do que é certo ou errado, sagrado ou profano. O que prevalece é a interpretação do líder, não há contestação devido ao medo do pecado de rebeldia (1 Sm 15:23a).
Os líderes precisam conscientizar-se da responsabilidade que é a pregação da Palavra. Ela não pode ser usada como instrumento de manipulação do povo nem servir aos seus próprios interesses. Do mesmo modo, o povo deve estar atento aos falsos mestres e seguir o que Paulo determina em Rm 16:17,18, sabendo que o fim dos que se utilizam do púlpito com objetivos espúrios está determinado em Fp 3:19.
Vivemos num país onde se lê muito pouco. Nossos jovens têm-se alienado com o bombardeio de informações que recebem todos os dias através do rádio, da tv, internet e tantos outros meios de comunicação que transmitem e informam apenas o que é interessante para a própria mídia. Essa deficiência reflete-se na vida de leitura bíblica, que é quase inexistente. É dever dos líderes cristãos estimular seu rebanho a ler a Bíblia, a apaixonar-se pela história sagrada, por que isso produzirá uma geração consciente de sua origem, seu valor, seus princípios e seu papel na terra.
3 – Resgatar o valor do discipulado

O número de membros arrolados virou um elemento determinativo na avaliação do "sucesso" de uma igreja. O líder deve ser um excelente pregador (entenda-se: pregar o que o povo quer ouvir), ter carisma, ter uma excelente equipe de marketing e ser um bom gerenciador de negócios. Podemos encontrar este tipo de líder em cada esquina, conseqüentemente, encontramos também milhares de igrejas-empresas em que os membros são "clientes" que pagam seu dízimo fielmente e recebem em troca a promessa de prosperidade ilimitada.
Essa transformação da igreja em empresa afetou diretamente o trabalho de discipulado que é fundamental na formação da identidade cristã do novo convertido.
O Senhor nos ordenou que pregássemos o Evangelho e fizéssemos discípulos (Mt 28:19). Por que estamos negligenciando esta ordenança? Não basta apenas pregar, é preciso cuidar daqueles que se convertem ajudando-os em sua nova caminhada. Eles enfrentarão lutas, serão confrontados por familiares, amigos, correrão o risco de cair (e muitos até cairão) e precisarão de apoio, de oração, de orientação, quem os ajudará? Esse é o papel do discipulador, daquele que se dispõe a ser referencial, daquele que oferece amor e sustento bíblico. Nossas igrejas precisam investir em pessoas, não em templos, não em ostentação.


Em tudo isso, concluímos que a secularização da igreja é uma realidade, mas uma realidade passível de ser mudada, transformada, e que a crise de transmissão da fé é passageira. Precisamos de novos líderes que amem ao Senhor acima de tudo, acima da fama, do dinheiro, do status, do orgulho. Nossa oração deve ser por avivamento, por quebrantamento de coração, por retorno à Verdade Sagrada, por discipuladores conscientes de seu papel como transmissores de conhecimento bíblico, como suporte para aqueles que ainda não aprenderam a caminhar com as próprias pernas.
Eu creio na Igreja, eu creio que meus filhos herdarão valores bíblicos, e creio, acima de tudo, que o Senhor é o maior interessado na manutenção da fé genuína, e por isso mesmo esta crise passará e será apenas uma desagradável lembrança da história da igreja, assim como o foram as cruzadas, a inquisição, a noite de São Bartolomeu e a omissão diante do holocausto.
A Deus seja a Glória para todo o sempre.

Gustavo Fraga,
é membro da Igreja Presbiteriana Independente de Vila Nova, Goiânia, Goiás.

Nenhum comentário:

Postar um comentário