24 maio 2006

"Lave seu Sofrimento com as Lagrimas da Esperança!"

“Com lágrimas se consumiram os meus olhos,
turbada está a minha alma, e o meu coração se derramou de
angústia por causa da calamidade da filha do meu povo; pois
desfalecem os meninos e as crianças de peito pelas ruas da cidade”
(Lamentações 2.11)

O livro das “Lamentações de Jeremias” é um relato do olhar do profeta para a cidade de Jerusalém, assolada, destruída e com cheiro de morte; situação causada pelo desterramento de boa parte de sua população para a Babilônia.
O livro das “Lamentações de Jeremias” é esse olhar para o sofrimento, numa tentativa de tentar compreende-lo e, ao mesmo tempo, harmonizar a sua realidade diante da fé.
Compreender o sofrimento é uma tentativa constante dos seres humanos em todas as eras e em todos os lugares. C. S. Lewis escreveu que “O erro e o pecado são um mal mascarado; o sofrimento é um mal às claras, indiscutível. Todo homem sabe que algo está errado quando sente dor”.[1].
É justamente a anormalidade do sofrimento que nos traz os mais tenebrosos questionamentos. Há momentos na vida que o céu parece estar longe demais e a terra não pode ser sentida sob os pés. Que o nosso olhar não consegue vislumbrar absolutamente nada à frente, e nem nossas palavras conseguem expressar. Nossos conhecimentos não explicam, nossa fé parece ser pequena demais, nossos credos, doutrinas e chavões até então cridos como verdades inflexíveis, parecem perder o sentido. Não há como pensar ou falar, tão somente ‘sentimos a dor’.
Diante do sofrimento podemos reagir de muitas maneiras:

1. indiferença:
Numa sociedade voltada para o consumo e para o bem-estar pessoal, a indiferença frente ao sofrimento dos outros é quase sempre a primeira alternativa a ser seguida.
Mark Twain, “É muito fácil lidar com a adversidade. Com a dos outros, especialmente”. [2]
Jeremias sentiu o sofrimento da cidade! Jeremias chorou a dor da cidade! Jeremias questionou a Deus pelo sofrimento da cidade. Jeremias orou a Deus para que consolasse os aflitos e angustiados da cidade. Jeremias sabia que somente Deus poderia consolar a dor daqueles que sofriam.
Como temos reagido frente ao sofrimento dos outros?
Jesus ensina-nos a reagir frente ao sofrimento dos outros... As palavras compaixão e misericórdia, são freqüentemente utilizadas para as ações de Jesus frente aos que sofriam. Precisamos pedir a Deus que encha nosso coração de compaixão por este mundo que sofre! O egoísmo, o amor a si mesmo, e a indiferença, a preocupação somente com o que me é próprio, são as marcas do inferno; mas o amor, a marca do Reino de Deus, nos faz voltar nossos olhos ao próximo e estender-lhes as mãos!

[1] O problema do sofrimento. São Paulo, Mundo Cristão, 1983, p. 67
[2] apud SWINDOLL, Charles. O Mistério da Vontade de Deus. São Paulo, Mundo Cristão. 2001, p. 14.
2. Revolta.
Jeremias não se deixa dominar pela indiferença, mas tampouco pela revolta. A rebeldia pode ocupar nosso coração se nossa visão sobre Deus for distorcida ou nosso conhecimento sobre Ele for superficial.
A revolta é a rebelião contra aquele que está no poder, ou que detém o poder. Diante do sofrimento muitos permitem que a revolta ocupe lugar no coração. A revolta contra Deus é, em suma, o sentimento que nasce por se considerar Deus impotente e, ou, indiferente.
Jeremias não se revolta contra Deus. Ele fica indignado com o sofrimento, mas não fica indignado com Deus.
O que Jeremias faz?

3. Jeremias lava seu sofrimento nas lágrimas da esperança (leia Jeremias 3.19-25).
Jeremias vai de encontro ao sofrimento, mas percebe que o olhar para o sofrimento pode secar a fé no coração. Sem Deus, o sofrimento torna-se absoluto. Mas a fé em Deus, é a certeza que não há outro absoluto senão Ele mesmo, (vs. 17-18).
Jeremias torna as suas lágrimas de indignação pelo sofrimento em lágrimas de esperança. Não é o soluço do rebelde e desesperado, mas o pranto do que crê e, por isso, espera em Deus.
Esta é a mesma experiência de Jó. O livro de Jó conta o caminho da revolta à esperança.

“Na fé cristã, a angústia não nos separa de Deus, mas ao contrário nos conduz a uma comunhão mais profunda com Deus. A fé cristã em Deus é essencialmente comunhão com Cristo, e a comunhão com Cristo é essencialmente a comunhão com o Cristo que foi tentado e que sofreu e se sentiu abandonado. Em sua própria angústia, o homem participa na angústia de Cristo, pois Cristo em seus sofrimentos passou pelos mesmos sofrimentos e angústias que afetam os seres humanos”

“Por isso, na espiritualidade cristã, Cristo crucificado sempre serviu de consolo na angústia e no medo. E, certamente, não precisamente porque Cristo, como Filho de Deus, pode viver essencialmente livre da angústia e incapaz de sofrer, mas sim precisamente por causa da sua ‘angústia e seu castigo’ (...) Isto se expressa de um modo impressionante naqueles versos de Paul Gerhardt: ‘Quando meu coração se encontra/ na angústia mais profunda/ livra-me das angústias/por tua angústia e teu tormento”[1].

Ézio Martins de Lima, rev
Igreja Presbiteriana Independente Central de Brasília - DF
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[1] MOLTMANN, Jürgen, Experiencias de Dios. Salamanca, Sigueme, 1983, p. 68.

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